Seny - Primeira Visita
O relato desta visita poderia tomar muitos rumos ao ter como foco diversos aspectos das condições da paciente e seus familiares. Da condição social, extremamente precária, da sua condição de mulher, mãe de treze filhos, de sua condição de saúde com aspectos inexplicáveis do ponto de vista da medicina. Mas Solenta é somente uma palhaça e em geral sabe reconhecer seus limites. Ela não pode melhorar a condição social de Seny, não pode curá-la, o máximo que pode fazer é estar ali e oferecer toda sua dedicação e presença para aquelas crianças e adolescentes ávidos por atenção.
Não consigo chamar Seny de "dona" como faço naturalmente com todas as outras pacientes, ela só tem 41 anos. Fez um cirurgia na língua para a retirada de um cancêr há quatro anos. Há dois anos teve sua última filha e desde então sofre de uma paraplegia que a faz ficar o tempo todo na cama. Na casa estavam sete filhos: Raíssa, Ronilson, Vilson, Juliana, Vilma (grávida de 5 meses), Valdinéia e Valdirene (mãe de Vinicius, que também estava lá).
O ENCONTRO
Não consigo chamar Seny de "dona" como faço naturalmente com todas as outras pacientes, ela só tem 41 anos. Fez um cirurgia na língua para a retirada de um cancêr há quatro anos. Há dois anos teve sua última filha e desde então sofre de uma paraplegia que a faz ficar o tempo todo na cama. Na casa estavam sete filhos: Raíssa, Ronilson, Vilson, Juliana, Vilma (grávida de 5 meses), Valdinéia e Valdirene (mãe de Vinicius, que também estava lá).
O ENCONTRO
Terezinha e Solenta chegaram ao portão da casa, que é a última de uma viela com várias moradias e até um bar com mesa de sinuca. Como ninguém veio atender depois de palmas e chamados, entraram falando: "oh de casa!" Passaram por uma minúscula cozinha e chegaram a um quarto que é dividido, em dois ambientes, por uma parede que tem a largura da cama de casal que está logo a entrada. O espaço que sobra entre a cama e a parede mal dá para duas pessoas passarem sem se esbarrar. Como era a primeira vez que Solenta ia até lá, não sabia que a pessoa que estava deitada nessa cama era Seny. Ela estava totalmente coberta com um lençol, deixando aparecer apenas um pedacinho do alto de sua cabeça. Os filhos e neto de Seny estavam vendo TV no fundo do quarto e quando viram Solenta e Terezinha foi aquela euforia. Quando Terezinha foi apresentar Seny para Solenta, foi informada pela filha Valdirene que a mãe não estava muito bem. Seny estava virada de lado, voltada para a parede, de costas para elas. Segundo a filha, não comia desde domingo e a toda hora parecia que queria vomitar mas não saía nada. Por um instante, Solenta se sentiu diante de um abismo, diante de uma situação na qual era totalmente impotente. Seny precisava de um tipo de cuidado que estava fora de seu alcance. Foi quando olhou para o lado e viu aquele mar de olhos curiosos e excitados. Solenta olhou para Terezinha e falou: "você cuida aqui que eu cuido ali." Solenta passou para o outro lado do espaço e a primeira coisa que ouviu de Vinicius foi: "eu quero um brinquedo." E Solenta rapidamente falou: "eu também, onde tem?" Impressionante como, rapidamente, todos entenderam que Solenta não estava ali para distribuir brinquedos. Juliana falou: "você veio examinar a gente." Solenta entrou na brincadeira: "isso mesmo, vim aqui examinar todos vocês, um por um, pela ordem de tamanho, começando pela pequenina Raíssa." Pegou Raíssa, colocou sentada na cama e pediu para ela fechar os olhos. Tirou de sua maletinha o rói-rói e fez o barulho em cima da cabeça dela. Ela caiu na gargalhada e depois Solenta pediu para ela reproduzir o som que ouviu e ela fez super bonitinho um som com a boca tentando imitar o barulho. E assim Solenta foi de um em um, para uns fazia barulhos, para outros palavras, frases. Impressionante como eles se divertiram com essa bobagem e como respeitavam a vez de cada um e gargalhavam juntos. Só Vilson ficava mais distante mas, quando chegava a vez dele, Solenta ia até onde ele estava e ele também se divertia com a brincadeira. Depois que Solenta fez o jogo com cada um, Juliana falou: "agora você vai examinar nossos corações." Dessa vez, o rói-rói virou um auscultador e de novo Solenta começou por Raíssa. Fez de conta que o coração dela batia muito forte. Gargalhada geral! Para Vinicius, falou: "vamos ver o que tem nesse coração..." E ele já foi logo dizendo: "minha mãe!" Nesse momento, Solenta ainda achava que Vinicius também era filho de Seny, e ao ouvir o coração dele, repetia: "eu amo minha mãe, eu amo minha mãe..." A partir daí, os outros começaram a brincar de entregar os nomes dos paqueras, namorados, amados de cada um. Cada coração batendo por um amor...
Depois disso, Solenta resolveu fazer um filminho de cada um para que dessem o depoimento que quisessem. Dessa vez Solenta começou pela mais velha. Foram filminhos de poucos segundos e todos foram declarações de amor à família, namorado e amigos. Chegou a hora de ir embora e Solenta se despediu de cada um prometendo retornar. Despediu de Seny dizendo que ela tem filhos lindos e amorosos, que ela está de parabéns pela linda família. Ela acenou com a cabeca concordando. Solenta e Terezinha partiram. Já no carro, perguntei para Terezinha se Solenta havia escolhido o caminho certo quando optou por ficar só com as crianças pois fiquei com medo que Terezinha tivesse se sentido abandonada. Ela disse que não, que o caminho escolhido foi bom. Ela percebeu como Seny ficou satisfeita ao ver que as crianças estavam bem com Solenta e que o quadro dela não era tão grave quanto o que pareceu a primeira vista. Ela havia se alimentado mais do que a filha havia dito e durante o encontro tomou suco e um remédio que iria fazer com que se sentisse melhor. Alívio total. Por fim é importante dizer que, apesar das condições extremamente difíceis em que a família vive, existe uma disposição para a vida e uma alegria comoventes.
Solenta, Vilson, Vilma, Juliana, Vinicius, Valdirene, Valdinéia, Raíssa e Ronilson
Terezinha, Vilson, Vilma, Juliana, Vinicius, Valdirene, Raíssa, Valdinéia e Ronilson
Declaração de Ronilson
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