D. Rosalina - Retorno

Quando chegamos à frente da casa, Terezinha quis tirar uma foto de Solenta antes de entrarmos. Uma moça, de nome Sônia, que estava sentada na calçada do outro lado da rua, correu para sair na foto também. A casa estava cheia. A filha Esalina, o filho Arlindo, a cuidadora Ester e mais uma ajudante de cuidados, se não me engano, de apelido Ira. Fui para esse retorno sem saber muito o que esperar dele, pois na primeira visita D. Rosalina estava com dor e o encontro transcorreu com o tempo arrastado, contudo, ele me deixou o caminho para a volta. Um caminho de três tempos. Um caminho de valsa. Tcha, tcha, bum... tcha, tcha, bum

Primeiro tempo: tempo de reconhecimento. Quando  Solenta entrou, D. Rosalina não a reconheceu e a chamou por outro nome. Aos poucos, D. Rosalina foi se abrindo. A cuidadora Ester é extremamente competente e afetiva e dá para sentir como D. Rosalina melhorou desde a última visita, quando a  cuidadora ainda era outra pessoa. Nesse primeiro momento, Solenta entregou um porta-retrato com uma das fotos tiradas no encontro anterior. Na foto estavam ela, a filha, o filho, a enfermeira Terezinha e a cuidadora anterior. D. Rosalina passou longo tempo olhando a foto, reconhecendo as pessoas que nela estavam. O filho Arlindo ficava envolta perguntando: "quem é esse aqui? E essa?" e ficava todo orgulhoso quando a mãe o reconhecia na foto. Solenta levou mais duas fotos e da mesma forma ela ficava longo tempo admirando. E quando digo longo é longo mesmo.

Segundo tempo: tempo de desabrochar. D. Rosalina foi ficando cada vez mais à vontade com Solenta. À vontade ao ponto de dizer várias vezes que achava Solenta bonita mas que seu nome era muito feio. Começou a chamar Solenta de Polenta e toda vez que ela falava a palavra polenta caía na risada. Isso virou uma brincadeira bem gostosa. Se quiséssemos fazê-la rir era só falar a palavra polenta. E dá-lhe polenta pra cá, polenta pra lá! E agora é que entra a valsa. No encontro anterior, D. Rosalina havia dito que seu marido tocava sanfona, que eles se conheceram em um salão de dança e que adoravam valsar. Solenta adquiriu um disco vinil de "valsas brasileiras", não chegou a ouvir antes, viu que o disco estava em bom estado e simplesmente foi ouvi-lo pela primeira vez com D. Rosalina. Foi um momento mágico pois, apesar de Solenta conhecer inúmeras valsas, de muitas delas não sabe nem o nome e nem o compositor e, ao colocar o disco, os primeiros acordes a inundaram de um sentimento forte, misto de alegria e nostalgia. E, ao olhar para D. Rosalina, parecia que estavam partilhando da mesma sensação. A valsa é "Branca" de Zequinha de Abreu e a interpretação é de Radamés Gnatalli. Não consegui a mesma gravação no Youtube para que possam ouvir, mas a música sim, e creio que a maioria das pessoas  a reconhecerá.

Arrastamos mesa, abrimos espaço no salão e Solenta valsou para D. Rosalina e também com ela, se sentando na beira do sofá e pegando em suas mãos. Depois foi a vez de Arlindo e também de Ester. D. Rosalina alternava entre um olhar que admirava seus parceiros e um olhar que se voltava para dentro. Sabe-se lá que lembranças e conexões internas as valsas estavam ativando nela. O certo é que ficou nítido como esse encontro estava nos fazendo bem.

Terceiro tempo: tempo de despedida. Solenta foi baixando a música, tiramos muitas fotos em várias composições e começamos as despedidas que foram longas pois não estava sendo fácil ir embora.
E na saída Terezinha ainda deu umas bexigas coloridas para D. Rosalina que gostou muito do presente e ficou a admirar os balões ainda vazios em suas mãos.  
Solenta foi embora tão feliz que quase chorou.




Esalina, D. Rosalina e Arlindo

Esalina e D. Rosalina
Sorriso gostoso
Ester e D. Rosalina


Tempos sem fim decifrando as fotos
D. Rosalina e as bexigas coloridas

A turma toda

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